Parece estranho alguém depreciar-se. Em privado, todos temos
essa experiência. Em público, é menos comum alguém realizá-la.
Eu não sou
diferente dos demais, mas às vezes desvalorizo-me embora sob a máscara de uma
certa superioridade desdenhosa de quem não precisa de elogios, nem dos próprios
nem dos alheios.
Não aqui. O que pretendo neste microensaio é
apenas esclarecer os motivos que me
levam a fazê-lo em público, sem uma ordem hierárquica de importância.
O principal e óbvio, que não é um verdadeiro motivo mas mais
uma constatação, é que me deprecio para dar razão aos que me depreciam. Como
sei que me depreciam? É simples, vendo como não me ligam absolutamente nada
quando estou com eles. Se é
assim, então porque me dou ao trabalho de lhes dar razão?
Em primeiro lugar, o que me leva a fazê-lo, com determinação
no tom e ênfase no conteúdo, é não os deixar ter o prazer de me contrariarem e,
ainda por cima, de me provarem, ironicamente e com facilidade excessiva, que eu
posso estar errado.
Em seguida, porque não quero envolver-me nessa “rat race” de tentar demonstrar que valho alguma coisa: “rat race”
porque só se consegue isto mostrando que valemos mais que os outros (e há
sempre alguém que vale mais do que nós).
Depois, a luta para provar que não sou alguém que deva ser depreciado é uma luta de e pelo poder, e poder, principalmente o
inatingível (com as devidas adaptações, aplica-se aqui o parêntesis anterior),
é algo que me horroriza… Ou assusta? Hmm, talvez ambos.
Supondo que eu não me depreciasse e todavia, mais tarde, ficasse
convencido de que afinal havia razões bastas para tê-lo feito? Sei a resposta:
sentiria (já me aconteceu sentir) uma vergonha retrospetiva tal que a
perspetiva terrífica de isso poder voltar a acontecer leva a que eu me
apresse a depreciar-me quanto antes.
A quinta razão é que depreciar-me de acordo com o que os meus
críticos pensam de mim é ganhar a ilusão (embora, infelizmente, não o delírio)
de ser finalmente compreendido por eles.
Por fim, quanto mais me deprecio mais me é permitido fazer o
que me apetece, pois deixa de haver standards a manter ou a conquistar perante os outros.
Entretanto, acabo de me aperceber que todos estes itens constituíram
mais uma oportunidade, não rejeitada por mim, de me auto depreciar. Ótimo, espero assim
ter deixado o assunto irrevogavelmente encerrado.
Comentários
Postar um comentário